Uma criança saudável tem grande chance de ser um adulto saudável. Este, por sua vez, tem uma chance maior de ser um idoso saudável se também se cuidar melhor. Uma criança que sofre de raquitismo por deficiência de vitamina D provavelmente chegará à terceira idade com sequelas. Da mesma forma que um adulto com osteomalacia também chegará mais vulnerável aos desafios ósseos na terceira idade
“Educação nutricional e suplementação nos alimentos são primordiais para combater a carência desta vitamina“, alerta o geriatra Dr. Davis Taublib, especialista da Sociedade Brasileira Geriatria e Gerontologia e Membro da Câmara Técnica de Geriatria do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro (CREMERJ).
No Brasil, o estudo BRAZOS (Brazilian Osteoporosis Study) avaliou 2.420 pessoas com mais de 40 anos de diversas regiões. No que diz respeito à vitamina D, o estudo constatou uma prevalência aumentada de hipovitaminose D (deficiência em 15,4% e insuficiência em 41,9%).
Sabe-se que a deficiência de vitamina D é fator de risco para osteoporose e fratura. Para se ter uma idéia da importância deprevenir fratura por osteoporose, o custo anual estimado no Reino Unido de fraturas por osteoporose está em quase 1bilhão de libras, sendo que 87% destas fraturas são do quadril. “Se correlacionarmos a deficiência de vitamina D como um dos fatores relacionados a essas fraturas, vemos o quanto é importante a prevenção por meio de iniciativas educacionais e terapêuticas”, chama atenção o especialista.
Dados mundiais, destacados pelo geriatra, apontam ainda que metade das mulheres idosas consomem menos do que 137 unidades de vitamina D, por dia, e quase um quarto consome menos de 65 unidades ao dia.
Como o organismo produz Vitamina D
A principal fonte de vitamina D nos seres humanos é a epiderme. Os raios ultravioleta convertem o 7 dehidrocolesterol em pré vitamina D3, que é isomerizada, convertendo-se em vitamina D3. A ingestão oral também se constitui em fonte de vitamina D2 e D3, mas isto representa menos de 20% do total necessário pelo organismo.
As vitaminas D2 e D3 são hidroxiladas no fígado na principal forma circulante 25 OH vitamina D, mas esta forma estável ainda não é metabolicamente ativa. No rim, há hidroxilação da posição 1 da molécula, formando então a 1,25 OH vitamina D3, esta sim metabolicamente ativa.
Esse processo é regulado pelo paratormônio (PTH) e pelas concentrações sanguíneas de cálcio e fósforo. Uma vez na corrente sanguínea, se liga à proteína que liga à vitamina D e passa a atuar nos tecidos através dos receptores da vitamina D nos núcleos das células.
Mecanismo de ação
A ação se faz via receptor nuclear específico para vitamina D. Este receptor controla mais de 200 genes, incluindo aqueles envolvidos com regulação celular, proliferação, diferenciação e apoptose.
Existe interação entre PTH e este receptor. Quando há baixa do cálcio sérico, o PTH é secretado pelas paratiroides que, a nível renal, irão estimular a produção destes receptores nucleares. A vitamina D então poderá agir, regulando a absorção de cálcio e fósforo.
Este receptor ainda possui outras funções: inibidor do crescimento celular, estimulador da secreção insulínica, modulador da função imune e inibidor da produção de renina.
Níveis de vitamina D
-- Nível ideal de vitamina D – 25 OH vitamina D acima de 30 ng/ml.
-- Insuficiência de vitamina D – nível de 25 OH vitamina D entre 21 e 29 ng/ml.
-- Deficiência de vitamina D – nível de 25 OH vitamina D abaixo de 20 ng/ml.
A forma mais estável para dosagem sérica é a 25 OH vitamina D, sendo, portanto, a mais usada clinicamente. Os níveis variam entre 10 e 55 ng/ml. Essa margem não reflete o limiar de estímulo para o PTH que, geralmente, é em torno de 30, causando aumento da remodelação com perda óssea.
O geriatra Dr. Davis Taublib, destaca que alguns autores têm demonstrado que a dosagem da forma 1,25 OH vitamina D3 seria mais sensível, mas nem sempre pode estar disponível. Ela pode estar aumentada na sarcoidose e no hiperparatiroidismo. Pode estar diminuída no raquitismo, hipoparatiroidsmo, pseudohipoparatiroidismo, osteodistrofia renal e psoríase.
Epidemiologia da deficiência de vitamina D
-- Estima-se que mais de 1 bilhão de pessoas no mundo tenham deficiência de vitamina D.
-- Mais de 40% de homens e mulheres idosas no mundo desenvolvido têm deficiência de vitamina D.
-- Metade das mulheres pós-menopausa em uso de medicação para osteoporose tem deficiência de vitamina D.
-- Mesmo em países como Índia, Turquia, Emirados Árabes e Austrália, estudos demonstram que entre 30% a 50% de crianças e adultos têm níveis abaixo de 20 ng/ml.
-- Após cirurgia bariátrica, predominantemente disabsortiva, 17 a 52% dos pacientes manifestarão deficiência de vitamina D em 2 anos, e 50 a 63% em 4 anos.
-- Cerca de 70 a 80% de renais crônicos são deficientes de vitamina D.
-- A deficiência de vitamina D está presente em cerca de30% de pacientes renais crônicos, principalmente nos diabéticos e naqueles em diálise peritoneal.
Origem da deficiência de vitamina D
Entre as causas que provocam a deficiência D no organismo estão:
-- Diminuição da ingestão de vitamina D pela dieta: as principais fontes são o leite e derivados, peixes como sardinha e atum, além de cereais enriquecidos com essa vitamina. Uma posta de salmão é fonte de 4,3 mcg, os outros peixes, na média, são fonte de 2 mcg. A diminuição desses nutrientes pode levar à deficiência.
-- Diminuição da absorção: principalmente na população idosa, a acloridria (ausência de ácido clorídrico no suco gástrico) é uma das causas da diminuição da absorção de cálcio. Essa hipocalcemia relativa leva a um hiperparatiroidismo secundário que pode ser atenuado pela administração da vitamina D – pois atua estimulando a absorção.
-- Cirurgia bariátrica predominantemente disabsortiva, além de doenças gastrointestinais que cursam com disabsorção e esteatorreia também causam deficiência de vitamina D. Um exemplo é a doença celíaca. “Ainda temos como causas: Insuficiência pancreática, doença hepatobiliar”, explica o especialista.
-- Redução da exposição solar: a exposição solar estimula a síntese cutânea de colecalciferol (Vitamina D3) a partir de 7 dehidrocolesterol. A diminuição da exposição solar pode levar à deficiência de síntese de vitamina D. Pode ocorrer, inclusive, pelo uso frequente de protetores solares ou pela inatividade por doença em indivíduos restritos ao leito ou com alto grau de dependência. Vale ressaltar que, na população idosa, além dos fatores acima, existe uma diminuição da capacidade não só de produção como também de estocagem desta vitamina.
-- Aumento do catabolismo hepático: o uso de medicações que induzem à atividade enzimática da p450 pode levar a uma deficiência de vitamina D.
-- Diminuição da síntese endógena no fígado: no fígado, a vitamina D é hidroxilada e se torna 25 hidroxivitamina D. Doenças parenquimatosas difusas podem levar à deficiência de vitamina D em estágios avançados.
-- Perda renal e insuficiência renal: existem múltiplos mecanismos relacionados à doença renal crônica. Na síndrome nefrótica, há perda de proteína que liga à vitamina D, resultando na deficiência. Além de perda da vitamina D na diálise peritoneal.
Manifestações extraesqueléticas
Vários estudos analisam a deficiência de vitamina D e sua relação com doenças cardiovasculares, doenças autoimunes e resistência insulínica e diabetes, assim como o câncer, observa o especialista. Porém, os estudos relacionados à reposição de vitamina D e consequente prevenção e melhora dessas doenças não são conclusivos, até o momento.
“Encontra-se em andamento o estudo VITAL (Vitamin D and Omega-3 Trial) estudo randomizado, placebo-controlado, que avalia a suplementação de 2000 UI/dia de vitamina D em 20.000 homens e mulheres em relação a essas doenças”, explica o geriatra Dr. Davis Taublib.
Manifestações esqueléticas
A osteoporose se caracteriza pela fragilidade do esqueleto e consequente redução de qualidade e quantidade ósseas. “54% das mulheres com mais de 50 anos tem uma fratura osteoporótica durante a vida. Cerca de 4% dos idosos com fratura de quadril morrem durante a hospitalização e 24% morrem após um ano da hospitalização”, observa o especialista, conforme estudos avaliados.
O especialista destaca ainda que o raquitismo e a osteomalacia se caracterizam por defeito na mineralização óssea e cartilaginosa em crianças e na mineralização em adultos. Já, hiperparatiroidismo secundário é mais uma manifestação da deficiência de vitamina D.
Para o tratamento nas doenças ósseas, o geriatra recomenda que o objetivo seja de manter os níveis de vitamina D acima de 30 ng/ml. “Este nível é eficaz para prevenir fraturas em homens e mulheres idosas, recomendando-se 800 UI/dia, podendo ser até 2.000 UI/dia em idosos e indivíduos com baixa exposição solar”, completa.
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