Estudo mostra que faltam no Brasil políticas de prevenção eficientes voltadas para a população idosa
A expectativa de vida da população brasileira aumentou, mas os idosos estão vivendo com menor qualidade de vida. A conclusão é do estudo A Transição de Saúde e as Mudanças na Expectativa de Vida Saudável da População Idosa: Possíveis Impactos da Prevenção de Doenças Crônicas, desenvolvido pela Faculdade de Saúde Pública (FSP), da Universidade de São Paulo (USP). Os resultados da pesquisa mostram que faltam no Brasil políticas de prevenção eficientes voltadas para a população mais velha.
O médico geriatra Alessandro Campolina, autor do estudo, diz que a medicina ainda acredita que prevenção é sinônimo de pacientes jovens. “A medicina deve trabalhar hoje com tratamentos preventivos para oferecer aos idosos expectativa de vida saudável. Há um preconceito em relação à prevenção de doenças em pessoas idosas que deve acabar. A prevenção de doenças é uma estratégia afirmativa, mesmo nas idades mais avançadas, para prolongar o tempo de vida e ganhar qualidade de vida, e o estudo comprovou isso”, relata.
A pesquisa foi feita com base em dados colhidos pelo Projeto Saúde, Bem-Estar e Envelhecimento (Sabe), desenvolvido pela FSP desde o ano 2000, que avaliou 2.143 idosos da cidade de São Paulo. Os pesquisadores, conforme Campolina, realizaram visitas a essas pessoas, para verificação de condições de saúde, capacidades e desempenho de atividades de vida diária.
Outros grupos de idosos foram inseridos na pesquisa em 2010 para que pudesse ser feita uma comparação da vida de indivíduos de diferentes gerações. “Por meio dessas avaliações foi verificado que nos anos de vida ganhos pela população estudada houve uma porcentagem maior de idosos que vivem doentes”, destaca o geriatra. Este tipo de fenômeno é chamado pelos médicos de expansão da morbidade e tem sido verificado em populações idosas de vários países do mundo.
Este dado foi utilizado por Campolina para direcionar o seu estudo que teve como objetivo o impacto da eliminação das doenças crônicas sobre a expectativa de vida livre de incapacidade da população idosa. Segundo o geriatra, algumas das principais doenças crônicas que acometem a população idosa são a hipertensão arterial sistêmica, doenças articulares, doença cardíaca, diabetes mellitus tipo 2, doença mental, doença pulmonar crônica e doença cerebrovascular.
Essas doenças, uma vez prevenidas, contribuem de maneira significativa para a melhoria da qualidade de vida e para a longevidade dos idosos. “Se um indivíduo tem diabetes, por exemplo, e se trata corretamente ele consegue viver como se não tivesse a doença”, exemplifica.
Um grande problema dos mais velhos, aponta o médico, é a quantidade de doenças crônicas que acometem ao mesmo tempo uma só pessoa. “A maioria dos idosos tem mais de uma doença crônica”, afirma Campolina. Ele explica que é difícil tratar várias doenças ao mesmo tempo, o que pode sobrecarregar o idoso com medicamentos e outros tratamentos, mas sabendo qual doença causa mais impacto na qualidade de vida daquela pessoa o médico pode priorizar o tratamento e consequentemente melhorar as outras enfermidades.
RANKING
A pesquisa feita pela FSP criou um ranking dessas doenças que ao serem tratadas e eliminadas gerariam maior qualidade de vida aos idosos. Para o sexo feminino, a doença cardíaca ficou em primeiro lugar, seguida pelo diabete mellitus e depois pela hipertensão arterial, em terceiro lugar. Já para o sexo masculino, as doenças eliminadas que geraram maior aumento de expectativa de vida livre de incapacidade foram a doença cardíaca (em primeiro lugar), a hipertensão arterial (em segundo lugar), a queda (em terceiro lugar aos 60 anos) e a doença pulmonar crônica (em terceiro lugar aos 75 anos).
Além de servir como orientação para os médicos para a realização de tratamentos com idosos, o estudo da FSP também é útil para auxiliar no planejamento de programas de prevenção e promoção da saúde. “A pesquisa mostra claramente que os idosos brasileiros não têm muitas opções de acesso à políticas de prevenção”, afirma Campolina.
O estudo revela que para que seja possível promover o envelhecimento ativo é preciso que a população mais velha tenha acesso a programas realizados pelos sistemas de saúde que incentivem a mudança nos hábitos de vida, realizem a inclusão social e estimulem o maior conhecimento sobre as doenças mais comuns na terceira idade.
POSTURA NEGATIVA
Além da falta de tratamentos preventivos, há ainda o problema da postura negativa do idoso em relação à sua própria saúde. Muitos idosos, conforme Campolina tem avaliado, não acreditam que é possível mudar sua própria vida para melhor. “O preconceito de que não existe solução para os problemas de saúde das pessoas mais velhas começa no próprio idoso. Há uma visão pessimista de que doença é normal neste período da vida e por isso muitos não procuram um médico para prevenir, e sim tardiamente quando a doença já está avançada.”
Aposentada convive com 3 doenças crônicas
A aposentada Amasiles Ribeiro Costa, de 71 anos, convive com três doenças crônicas: diabete, hipertensão e arritmia. Ela conta que descobriu que sofria dessas doenças após passar mal. “Não tenho o hábito de ir ao médico para fazer exames de prevenção. A gente sente medo de descobrir doenças mais sérias por causa da idade”, diz.
Hoje Amasiles toma remédio para hipertensão e tem em casa um medicamento para o caso de sentir dores no peito. Segundo a aposentada, sua alimentação é controlada, por causa da diabete, mas ela não consegue controlar o nervosismo. “O nervosismo ajuda muito a piorar os meus problemas de saúde, mas nunca pensei em tentar fazer algo para ficar mais calma porque é muito difícil”, ressalta.
A aposentada mora com a mãe de 90 anos, Izabel da Costa Ribeiro, que também sofre com mais de uma doença. Izabel tem mal de Parkinson, hipertensão e artrite. “Vivemos bem, mas não posso dizer que temos uma boa qualidade de vida. As pessoas idosas no Brasil realmente não vivem a velhice de forma saudável. Confesso que é preciso ter mais ânimo para procurar tratamentos médicos mais vezes”, conclui.
De acordo com o médico geriatra Alessandro Campolina, apesar do estudo mostrar uma realidade negativa, de que na última década houve uma queda na qualidade de vida da pessoa idosa, há também um lado positivo na pesquisa. “O resultado da pesquisa é ruim, mas é satisfatório quando mostra que é possível mudar esse quadro por meio da prevenção das doenças crônicas nos idosos”, acentua.
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