O número de brasileiros com mais de 65 anos tem aumentado a cada censo realizado pelo IBGE (em 1991 eles representavam 4,8%, em 2000, 5,9%, e em 2010 eram 7,4% da população brasileira), resultado dos avanços da medicina e da melhor qualidade de vida. O estudo “Direitos dos idosos relacionados à sua mobilidade”, realizado no início deste ano pelo Grupo de Pesquisa Comportamento em Transportes e Novas Tecnologias do Programa de Pós-Graduação em Transportes da Universidade de Brasília (UnB), revelou que no Brasil, a população envelhece em um contexto desfavorável, com riscos altos à saúde e à vida. Os equipamentos públicos ainda não estão devidamente preparados para promover a acessibilidade dessa fatia da população, que só tende a aumentar. De acordo com pesquisa realizada pela Fundação Oswaldo Cruz em 2002, citada pelos pesquisadores da UnB, nas capitais e regiões metropolitanas, os acidentes de trânsito e as quedas ocupam os dois primeiros lugares no conjunto de mortalidade por causas externas específicas em idosos.
O estudo da UnB revelou que a maioria dos trabalhos de planejamento urbano e de transporte ainda não consideram as distintas capacidades de locomoção. “Muitas vezes, a dificuldade de locomoção dos idosos está associada com a má qualidade das vias de pedestres”, apontam os pesquisadores. A solução trazida para este problema, segundo o material brasiliense, foi um conjunto de estratégias do norte-americano Charles Wright. Para ele, seria necessário o alargamento de calçadas, a implantação de calçadões e ruas de pedestres, retirada dos obstáculos das calçadas, o avanço de calçadas nas esquinas (para reduzir a distância de travessias do pedestre), uso diferenciado de texturas e pinturas para guiar a caminhada por rotas mais seguras, utilização de dispositivos para reduzir a velocidade do trânsito motorizado (desde ondulações transversais à fiscalização eletrônica), implantação de fases para pedestres nos semáforos, educação dos motoristas para respeitar a faixa de pedestres, implantação de passarelas sobre avenidas de alta velocidade e de refúgios e ilhas de segurança para pedestres.
Pelo Censo de 2010, os idosos já são 7,4% da população; mobilidade e acessibilidade
urbanas são os desafios para a faixa etária. (Crédito: Agência Brasil)
Na prática
Por outro lado, uma das autoras da pesquisa da UnB, a mestranda em transportes Aline Gomes de Oliveira entende que não existe uma fórmula perfeita, pois existem diferentes realidades que envolvem questões culturais, hábitos e condições distintas. “O importante é estudarmos estas questões para conseguirmos apresentar soluções palpáveis para melhorias reais da sociedade. Outro ponto importante é estreitar o hiato temporal entre a ciência e a prática com o intuito de implementar aquilo que é estudado”, afirma a pesquisadora.
No Brasil, um dos principais avanços nessa área foi o Estatuto do Idoso, lei nº 10.741/2003. Neste documento, instituiu-se que a diminuição de barreiras arquitetônicas e urbanas seja uma das preocupações das áreas de habitação e urbanismo. Além disso, garantiu os seguintes direitos aos idosos: gratuidade para transporte coletivo urbano e semiurbano para pessoas acima de 65 anos mediante apresentação de documento comprobatório; a reserva de 10% dos assentos nos transportes públicos devidamente identificados com placas visíveis; dois assentos com gratuidade em transportes interestaduais para idosos que recebam até dois salários mínimos e 50% de desconto para os que têm a mesma condição financeira caso os dois assentos já estejam ocupados; prioridade de embarque para transportes coletivos e 5% das vagas de estacionamentos públicos e privados destinadas a essa faixa etária. De acordo com Aline, o Brasil avançou no âmbito legal, mas por outro lado em mudanças efetivas ainda “deixa a desejar”, principalmente quando a própria sociedade não respeita estes direitos adquiridos. “Não adianta ter gratuidade nos transportes se o transporte coletivo público se recusa a parar ao ver a identificação do idoso, nem ter assentos demarcados e vagas reservadas quando a própria população não os respeita.”
Entre outras disposições, o Estatuto do Idoso estabeleceu a reserva de dois assentos
gratuitos para quem tem mais de 65 anos em ônibus interestaduais. (Crédito: Agência Brasil)
O mundo também tem se movimentado para se adaptar a esse novo perfil populacional. Em 2002 a Organização das Nações Unidas promoveu em Madri a II Assembleia sobre o Envelhecimento, que elegeu como plano de ação no que se refere a habitação e condições de vida os seguintes objetivos: promover habitações adequadas aos idosos; garantir a facilidade de acesso aos edifícios e espaços públicos; cuidar para que nos novos espaços não haja obstáculos à mobilidade e ao acesso; desenhar alojamentos e espaços públicos multigeracionais e promover desenho de veículos que considerem as necessidades das pessoas com idade e as com deficiências.
Para preparar as cidades para receberem os idosos que em breve serão grande parte da população mundial, a Organização Mundial da Saúde criou o “Guia Global: cidade amiga do idoso” . Para entender as características necessárias para que uma cidade tenha condições favoráveis para uma melhor qualidade de vida para pessoas com mais idade, foram entrevistados idosos de 33 cidades de todas as regiões do mundo. No Brasil, a OMS entrevistou moradores do Rio de Janeiro. Na maioria das cidades, os relatos dos idosos foram complementados por informações colhidas em grupos focais de cuidadores e prestadores de serviços dos setores público, privado e voluntariado. Os resultados já podem ser notados no mobiliário urbano das praças, por exemplo, que nas principais cidades brasileiras contam com academias para a terceira idade.
Segundo Paula Oliveira, vice-presidente do Conselho Nacional de Direitos do Idoso (vinculado à Secretaria de Direitos Humanos), no Brasil ainda é “um sonho” a implantação de uma política pública que garanta a mobilidade e a acessibilidade ao idoso de maneira universal e igualitária. “O que se tem são experiências exitosas e isoladas em algumas cidades do Brasil e que contemplam setores específicos, isto é, ou ônibus adaptados, ou programas habitacionais com unidades residenciais adaptadas, ou calçamento livre de buracos e com rebaixamentos apropriados. Infelizmente, no Brasil, ainda não encontramos cidades preparadas para atender populações multigeracionais e com limitações diversas e diferenciadas.”
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