Brasília – Os meninos de hoje – nem seus pais – não imaginam o Brasil que deverão carregar nas costas quando forem adultos. Eles terão que dar um duro danado para sustentar uma massa grande e crescente de idosos, produzindo mais, arcando com impostos maiores do que recolhe a atual geração e pagando mais caro pela Previdência Social e a saúde. Ou seja, se o quadro de hoje está ruim, pode ser pior. É que o chamado bônus demográfico, que o país experimenta desde os anos 1970 e é capaz de atenuar essa fatura, está acabando, sem que tenha sido aproveitado devidamente.
O fenômeno – estrutura etária que todo país experimenta uma única vez na sua história, em que a quantidade de mão de obra disponível (adultos) é proporcionalmente bem maior que a de dependentes, composta por idosos, crianças e adolescentes – é ideal para promover maior crescimento da economia e desenvolvimento do país. Por isso, é também chamado de "janelas de oportunidades". Existindo poucos dependentes para sustentar, o ganho de produtividade gerado por essa mão de obra farta pode ser revertido em investimentos na qualificação das crianças e em infraestrutura para garantir um futuro de mais inativos, porém, sem sacrifício excessivo.O drama é que o Brasil tem, segundo especialistas, no máximo 15 anos para acelerar o processo de escolarização e qualificação das crianças e dos jovens, erradicar a pobreza, resolver os problemas de infraestrutura, de qualidade das habitações e dos sistemas de saúde e de previdência. O auge do ganho de mão de obra farta deve ser atingido em 2020, conforme projeções do Banco Mundial e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quando a proporção de adultos (acima de 14 até 60 anos) alcançará 66,2% da população, para 20,1% de crianças (até 14 anos) e 13,7% de idosos (60 anos ou mais).
A partir daí, começa a decrescer a participação dos adultos no total da população, com aumento crescente dos idosos e que viverão mais tempo. Em 2050, os mais velhos serão cerca de 30% da população com expectativa de vida de 80 anos, em média. Em 1980, eles eram apenas 6,1% (veja quadro),. "Tudo dependerá do que o país fizer nesses anos que ainda tem pela frente de bônus demográfico. É uma janela que se fecha um pouco a cada ano. Na hora que for fechada completamente, a conta vai vir", afirma o professor do mestrado em estudos populacionais e pesquisas sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (Ence) do IBGE, José Eustáquio Diniz.
Novo padrão - Esses 15 anos são o prazo para preparar as crianças e jovens de hoje – que, em 2050, terão em média 40 anos – para garantir o sustento de uma população cada vez mais velha, que necessitará não só de renda do sistema previdenciário, como também de um sistema de saúde eficiente. Se a nação não conseguir atingir esses objetivos até 2025, as famílias brasileiras passarão por momentos muito difíceis. Nem os adultos de amanhã bem preparados e qualificados deverão dar conta da fatura a ser paga. "Eles terão que ser supertrabalhadores", resume a professora do Instituto Insper, Regina Madalozzo. Segundo ela, esse novo padrão de vida que a população está experimentando nos últimos anos não é sustentável no longo prazo.
Aperto na Previdência - Regina Madalozzo, do Instituto Insper, não tem dúvida de que a situação atual de aperto nas contas do sistema previdenciário da Previdência Social e do serviço público, que acumula déficits cada vez maiores, ficará pior. "Haverá mais pessoas recebendo do sistema e menos contribuindo", lembra ela. Regina lamenta o pouco aproveitamento do período do bônus demográfico. "Todas as medidas que forem tomadas daqui para frente serão para consertar, tentar minimizar o estrago já feito", diz ela.
O economista José Márcio Camargo prevê um futuro bem sombrio, que comprometerá a qualidade de vida dos idosos de amanhã, que já não é das melhores atualmente. "Acho que em algum momento teremos que fazer ajuste na quantidade de recursos que podem ser dedicados aos idosos", diz. Ele destaca que, apesar de ter atualmente uma parcela pequena de idosos – os acima de 60 anos são 10% da população e aqueles com mais de 65 anos, 7,4% –, o país já compromete 13% do Produto Interno Bruto (PIB) com aposentadorias e pensões do sistema público e privado. "O Brasil resolveu favorecer seus idosos em relação às suas crianças. Gasta apenas 4% do PIB com educação fundamental e média", critica.
Ele só vê dois horizontes no futuro: "Ou a carga tributária sobre os futuros adultos será muito alta para poder sustentar uma porcentagem maior de idosos, ou terá que diminuir a quantidade de recursos destinados aos inativos", avalia Camargo. Segundo ele, a previdência do funcionalismo é ainda mais escandalosa. "Quanto mais tempo leva para resolver esse problema, mais grave ele vai ficando ".
José Eustáquio Diniz, do IBGE, não vê um sistema previdenciário futuro saudável. Dependendo das dificuldades enfrentadas, o governo será obrigado a cortar os benefícios. Os altos valores pagos hoje pelo serviço público deverão ser os primeiros afetados. "Ninguém está garantido", avisa.
Poupança - Para fazer frente às dificuldades futuras que vêm com o envelhecimento da população, as famílias devem se preparar desde já, reforçando a poupança, que não se traduz apenas no acúmulo de dinheiro para complementar aposentadorias, segundo os professores José Eustáquio Diniz, do IBGE, e Fernando Botelho, da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) da Universidade de São Paulo (USP). Mas principalmente em investimentos na saúde, educação e qualificação dos filhos. Se houver condição, afirmam, deve-se investir em bens imóveis e também numa reserva financeira. Com filhos preparados e produtivos, os pais terão uma condição melhor na velhice, observa Diniz. Ele só alerta para o consumo exacerbado de bens perecíveis ou que perdem valor com o tempo.
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