Terceira idade se joga nas redes sociais


Velhos hábitos continuam, como exibir fotos da família ou papear com amigos, só que agora pela rede mundial de computadores.Na semana passada, o computador de Sebastiana Martins, de 78 anos, ficou estragado por três dias. Foi um tempo de agonia. "Parece que eu tô sem roupa, bem!", disse ela à reportagem na terça-feira passada. "O estabilizador liga, mas a CPU está fazendo um barulho muito estranho, vuuum, vuuum..." A aposentada estava, então, privada de um dos passatempos mais divertidos que encontrou nos últimos anos: fazer pesquisas no Google, "puxar" música no YouTube, checar e-mail e conversar com alguns de seus 107 amigos no Facebook.

Apesar de ter nascido 60 anos antes do início da internet no Brasil, Sebastiana é usuária ativa da rede mundial de computadores. A barreira do contato com a máquina ela venceu há alguns anos - basta ver a familiaridade da ex-costureira com a descrição das peças que compõem um PC e a sua disposição para mexer no Mac da neta Raquel. Nem o vocabulário digital é segredo para ela. "Adoro receber pps", diz. Pps é a terminação de arquivos gerados pelo Power Point no formato de apresentação de slides.
A avó entende até o que é mensagem privada no Facebook. "Ah, se quiser me achar lá (na rede social), eu sou uma senhora linda de cabelos brancos. Mas procura pelo nickname. Meu nickname é Lelé."

Embora a atividade virtual de Lelé impressione, ela não é uma entre poucas avós "conectadas". Segundo a empresa de pesquisa comScore, 84,2% dos internautas brasileiros acima de 55 anos estão presentes no Facebook, conforme levantamento de agosto. Nesse mês, cada um deles gastou, em média, 586 minutos na rede social, ou seja, 19 minutos por dia.

A presença significativa na rede é uma consequência do crescente acesso dos mais velhos à internet. Apesar de responder pela menor parcela de internautas, o número de pessoas acima de 50 anos na web cresceu 222,3% entre 2005 e 2011, para 8,1 milhões, segundo o IBGE. Trata-se de um público que frequenta sites de notícias, faz compras online e muitas vezes mantém contato com filhos por serviços como Skype.

Para Cristina Fogaça, mestre em gerontologia e diretora da Faculdade Aberta para a Maturidade Ativa (Fama), a imersão da terceira idade nesse ambiente virtual resulta da mais fácil assimilação das novas tecnologias hoje. "Tecnologia não é mais um bicho de sete cabeças para eles como era antigamente", diz. A especialista conta que suas alunas são encontradas facilmente no Facebook fora do horário de aula e que há algumas que, durante passeios, publicam foto no site e na mesma hora recebem várias "curtidas" e palavras de incentivo.

As irmãs Lima conhecem bem esse tipo de interação online - e não só via Facebook. Ivani, de 59 anos, Jandira, 67 anos, Irani, 69 anos, Iracy, 74 anos, Jacyra, 77 anos, se encontram online todos os dias para jogar tranca. "Às vezes a gente fica até uma hora da manhã jogando", diz Irani.

Com exceção de Irani, que se diz "fuçona" e desmonta o computador para limpar a parte de dentro, as irmãs contam com a ajuda do sobrinho Ricardo para descobrir o mundo da web. Gerente de projetos da IBM Brasil e colunista voluntário do Portal da Terceira Idade, ele fala com encanto do modo como suas tias e outros familiares abraçaram as novas tecnologias. "Meu sogro, de 64 anos, é aposentado, mas trabalha como temporário em feiras de exposição para as quais ele se candidata online."

Desafio. Antes de encarar a internet, existe o desafio de encarar o novo universo de um computador, com sua área de trabalho, atalhos, pastas e navegadores. Segundo pesquisa do Ibope Media, mais da metade dos brasileiros entre 65 e 75 anos dizem ainda se sentir confusos com computador, apesar de 28% se manterem atualizados com os avanços tecnológicos.

O medo de estragar o equipamento e instalar vírus estão entre os receios mais comuns no início do aprendizado, segundo professores de informática. William Henrique, que ensina idosos há 15 anos, diz que seus alunos se dividem em duas categorias: uma delas nunca teve contato com computador e a outra tem noções da informática de anos atrás. "Alguns aprenderam a usar o MS-DOS e a linguagem BASIC, já completamente obsoletos, só para você ter uma ideia."

Por isso, diz ele, paciência e respeito ao ritmo são ingredientes fundamentais. O PC de Lelé, por exemplo, não estava estragado. A máquina não estava ligando porque, provavelmente, Lelé estava demorando com o dedo no botão da CPU.

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