Ao completar 99 anos, idoso dá a receita da longevidade


A enxada é o apoio para a longevidade de Seu EduardoO rosto corado, olhos azuis vivíssimos, um suave sorriso permanente e a quase ausência de rugas podem tentar esconder, mas o morador de Santos Reis, Eduardo Kasper, completa 99 anos neste final de semana.

Seu sítio estará repleto de parentes, com os filhos, netos, bisnetos e tataranetos. “Acho que não vai ter lugar para tanta velinha no bolo”, brinca o idoso.

A vida simples do campo se apresenta como o suporte para a força vital do seu Kasper. Segundo Rose Viegas, sua cuidadora, ele come de tudo, sem restrições. “Ele come pouco, mas de tudo que é bom”, acrescenta.

Sobre a empregada, Eduardo Kasper brinca. “Eu é que cuido dela”, fala o homem que poucas vezes na vida precisou consultar um médico, e não dispensa um copo de vinho tinto de vez em quando.

Tragédia
A vida de Seu Kasper começou com tragédia. A mãe morreu no parto em que ele e o irmão nasceram em 1914. Numa época de poucos recursos, não foi possível buscar ajuda, e o irmão gêmeo também faleceu três semanas depois. Com o novo casamento do pai, logo depois, Eduardo passou a ser criado pelos avôs e tios.

“Sempre me trataram muito bem”, destaca.
Mudou-se para Santos Reis aos 8 anos de idade. Casou-se aos 18 anos, e trabalhou em apenas duas empresas até se aposentar; uma fábrica de salames e uma olaria, ambas na localidade.

Desenvolvimento
A região de Santos Reis foi muito progressista. Eduardo Kasper conta que pela estação férrea passava boa parte da produção agrícola e industrial da localidade. “Dali saia toda semana um vagão de telhas para Caxias do Sul. E para Porto Alegre ia o leite produzido nas propriedades daqui”, conta. Com a desativação da viação férrea, houve uma retração, e nenhuma das empresas em que Kasper trabalhou existe mais. Como lembrança daquele tempo, se mantém imponente a chaminé da velha olaria. “Aquilo ali nunca vai tombar. Eu levava os tijolos pros pedreiros construírem”, relata, olhado a construção que fica a 500 metros de sua casa.

Rotina
Desde que ficou viúvo, há 24 anos, Eduardo Kasper mantém uma rotina que, segundo ele, o mantém sempre forte. Acorda às 7 da manhã, toma chimarrão acompanhando as primeiras notícias do dia pelo rádio. Depois toma seu café, com direito a pão de milho, käshmier e leite. “Vou criar umas galinhas para ter ovo todo dia também”, aponta. Em seguida, com os passos miudinhos, segue até o arvoredo, pega uma enxada e faz um eito de capina. “A enxada é minha bengala”, acrescenta. Rose conta que ele não pode ver um capim surgindo que já vai para a capina. Outra ocupação do idoso é uma criação de porcos, que um filho colocou num chiqueiro no fundo do terreno. Quando chove, seu Eduardo se permite ficar um pouco mais na cama.

“Descansar um pouco faz bem”, fala sorrindo. Guerra Como nasceu em 1914, numa região de colonização germânica, Eduardo Kasper foi alfabetizado em alemão.

Foi depois dos dez anos que começou a aprender a falar Português. E ele lembra como este detalhe era importante na década de 1940, quando a mundo assistiu a Segunda Guerra Mundial. “Por aqui vinha policiais e ficavam ouvindo do lado de fora da casa, para ver quem falava alemão”. O idioma estava proibido na época. “Algumas pessoas foram levadas para a delegacia”, lembra Kasper. Ele mesmo era atacado por policiais a cavalo, em seu trajeto para o trabalho. “Eu já ia falando com eles em Português e eles me deixavam passar”, relata.
A vivacidade de Eduardo Kasper deixa escapar um comentário interessante. “Na guerra era cheio de polícia aqui para cuidar da gente, agora não tem nenhum para dar segurança”.

Identidade
Uma surpresa aguardava Eduardo Kasper no dia de seu alistamento. Os documentos mostravam que ele, na verdade, era Pedro Hugo. A confusão ocorreu na morte de seu irmão, com a troca dos documentos. Desde então, legalmente, nos papeis, ele se chama Pedro Hugo Kasper, mas para toda a família e amigos, seu nome é Eduardo. Eduardo Kasper, o quase centenário morador de Santos Reis.

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