Covardia! Cresce violência contra idosos



Violência contra idosos é subnotificada porque maioria não tem coragem de denunciar

Dos registros, 76% envolvem algum tipo de negligência como, por exemplo, deixar de levar a pessoa ao médico, privar de alimentação e até abandono. Outros 24% são denúncias de agressões físicas.
Em todo o ano passado foram registrados 167 casos de violência contra idosos.
De fato, a estatística se concretiza a cada dia. Somente entre domingo e segunda-feira, por exemplo, o Jornal da Cidade recebeu três denúncias envolvendo suposta negligência (leia mais abaixo), abandono e violência física contra idosos em Bauru.
A última e mais intrigante, registrada no plantão permanente da Polícia Civil na noite de anteontem, envolveu o abandono de um homem viúvo de 85 anos que teria sido trancado pelos próprios familiares em um quartinho aos fundos de uma casa no Jardim Redentor. O homem foi resgatado após a denúncia feita por um vizinho.
No registro consta que, ao pularem o portão da casa, os policiais militares encontraram o idoso se arrastando em direção a um banheiro. No local, não havia nenhum tipo de alimento, apenas uma garrafa pet com pouca água. Aos policiais, o homem soube informar entre poucas e desconexas palavras somente seu nome, idade e que teria sido deixado pelos parentes.
Conforme o boletim de ocorrência, os responsáveis pelo viúvo que, segundo relatos de vizinhos, morariam na mesma casa, teriam mudado da residência em questão no último sábado. A reportagem esteve no local à procura de informações sobre o paradeiro da família ou de algum parente do viúvo, mas ninguém foi encontrado.
Desnutrido e desidratado, o homem foi encaminhado ao Pronto-Socorro Central (PSC) pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) que, conforme populares, demorou quase quatro horas para chegar ao local da ocorrência.

Violência
Ainda no domingo, no Núcleo Habitacional Mary Dota, uma mulher de 59 anos registrou boletim de ocorrência por maus tratos aos pais que morariam com um irmão dela. Ao chegar à residência onde vivem seus genitores, de 97 e 87 anos, ela relata tê-los encontrado em estado degradante. A mãe apresentava hematomas pelo corpo e o pai havia defecado na própria roupa.
Ainda na casa havia também uma mulher que informou que o outro filho do casal havia lhe incumbido apenas de fornecer medicamentos a ambos. Os idosos foram acolhidos e levados para a residência da filha denunciante. A reportagem entrou em contato com a mulher que informou que, após o susto, os pais passavam bem.

Violência é subnotificada, diz Sebes
Segundo a secretária municipal do Bem-Estar Social, Darlene Tendolo, uma das maiores dificuldades em relação ao crime de maus-tratos estaria na falta de coragem das próprias vítimas em denunciar a violência.
Dos 58 registros deste ano, 15 foram encaminhados ao Ministério Público Estadual. A outra parte é acompanhada por agentes da Sebes diante da negativa das vítimas em levar as denúncias adiante.
“Infelizmente recebemos muitos casos de conflitos familiares envolvendo idosos todos os meses em Bauru. Grande parte envolve denúncias como apropriação de bens que acabam resultando em abandono e negligência que vêm de todos os lados. Geralmente, essas ações são praticadas pelos filhos ou parentes não tão próximos ao convívio do idoso, que, na maior parte, acabam não tendo coragem de levar a denúncia adiante”, enfatiza.
Em contrapartida, Darlene cita as políticas públicas do município e as ações que têm contemplado centenas de pessoas com mais de 60 anos. “Procuramos trabalhar intensamente com a autoestima e a autonomia dos idosos. Os Centros de Convivência, por exemplo, promovem palestras, oferecem alimentação e atividades para que o idoso fique cuidado e se sinta mais independente e valorizado”, comenta.
Atualmente, Bauru possui 10 Centros de Convivência que atendem 340 pessoas em idade avançada por dia, além de projetos como o realizado na praça Gastão Vidigal, no Jardim Ferraz, que promove caminhadas e exercícios. Já direcionado a pessoas com algum tipo de deficiência, o município possui convenio com entidades que assistem 297 homens e mulheres com mais de 60 anos. Mais informações sobre os projetos ou funcionamento dos centros podem ser obtidas pelo telefone (14) 3227-8624 e 3234-1090.

Idosa de 98 anos fica na fila de espera para ser internada
Oito dias. Esse foi o período de espera por uma família para internação de sua matriarca de 98 anos que esperava, desde segunda-feira da semana passada, no Pronto-Socorro Central (PSC) por uma vaga em um hospital público da cidade para o tratamento de uma pneumonia.
Cansados da demora, familiares da idosa procuraram o Jornal da Cidade para denunciar a suposta negligência. “Ela foi muito bem atendida pelo PSC, mas já entrou até em coma aqui. Precisamos interná-la em um hospital para o tratamento adequado. Uma enfermeira me disse que, quando não tem vaga, a preferência é dada para quem é mais jovem. Eu mesma vi entrando e saindo gente desses quartos e ela está aqui ainda. Isso é um absurdo”, reclama a neta da paciente Carolina de Campos Penteado, a arquivista Angélica Assumpção, 38 anos.
A preocupação com o agravamento do quadro de saúde da idosa, que já passou até mesmo por uma espécie de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) improvisada dentro do próprio PSC, fez com que a família procurasse a Defensoria Pública, que, segundo a neta, ainda ontem tentaria a transferência da avó por meio de uma liminar.
Vagas
Em conversa com o diretor do Departamento de Urgência e Emergência da Secretaria Municipal de Saúde, Luiz Antônio Bertozo Sabbag, a reportagem foi informada que o problema estaria na liberação das vagas pelo Hospital Estadual (HE).
“A vaga já foi solicitada por duas vezes. Enquanto o hospital não liberar não temos como fazer nada. Para nós, não existe preferência por um caso ou outro. Todos são atendidos, inclusive, idosos doentes. Mas por causa da falta de leitos na cidade, infelizmente, a espera para casos envolvendo doenças é maior do que para os traumas”, admite.
Por meio de nota, o Departamento Regional de Saúde (DRS) de Bauru informou que as internações para tratamentos de doenças como pneumonia são de responsabilidade da esfera municipal.
“De acordo com o Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) do Ministério da Saúde, Bauru mantém apenas 13 leitos de internação para uma população de aproximadamente 350 mil habitantes. Ou seja, um leito para cada 23 mil munícipes. Segundo estudo realizado pelo DRS, cerca de 2 mil internações realizadas somente no ano passado poderiam ser claramente absorvidas pela assistência básica de saúde, ligada à Secretaria Municipal de Saúde de Bauru”, rebate o DRS.
Após a reportagem entrar em contato com a diretoria do PSC e com o Hospital Estadual, a idosa foi finalmente transferida para o HE e iniciou o tratamento.

Legislação
O Estatuto do Idoso foi aprovado em setembro de 2003 e institui penas severas para quem desrespeitar ou abandonar cidadãos da terceira idade.
Prega o artigo 4º que “nenhum idoso será objeto de qualquer tipo de negligência, discriminação, violência, crueldade ou opressão, e todo atentado aos seus direitos, por ação ou omissão, será punido na forma da lei”.
De acordo com o artigo 10º, “é obrigação do Estado e da sociedade assegurar à pessoa idosa a liberdade, o respeito e a dignidade, como pessoa humana e sujeita de direitos civis, políticos, individuais e sociais, dos espaços e dos objetos pessoais”.
O artigo 15º do estatuto assegura a atenção integral à saúde do idoso, por intermédio do Sistema Único de Saúde (SUS), garantindo-lhe o acesso universal e igualitário, em conjunto articulado e contínuo das ações e serviços, para a prevenção, promoção, proteção e recuperação da saúde, incluindo a atenção especial às doenças que afetam preferencialmente os idosos.


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