Combate à hipertensão está entre desafios do processo de envelhecer com HIV e aids, alertam especialistas




A doença provoca estreitamento das artérias, o que aumenta a necessidade do coração bombear com mais força para impulsionar o sangue e recebê-lo de volta. Como consequência, a hipertensão dilata o coração e danifica as artérias. Várias podem ser as causas da hipertensão, e tanto fatores externos (como tendência genética, peso e idade) como internos (em sua maioria relacionados ao estilo de vida) podem contribuir para seu desenvolvimento.

João Lino Vendito, coordenador de Projetos da Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/Aids de Campinas, é hipertenso há seis anos. Ele tem 59 anos e convive com o HIV há 18. Nos seis anos em que descobriu as alterações na pressão arterial, colesterol e triglicérides, João já infartou três vezes e teve que fazer uma angioplastia. Atualmente, além do coquetel antiaids, ele toma dois remédios diários para pressão e um para afinar o sangue. Segundo ele, os problemas de pressão começaram depois de iniciar a combinação dos antirretrovirais efavirenz e biovir.

No entanto, a infectologista do Centro de Referência e Treinamento (CRT) em DST/Aids de São Paulo Roberta Schiavon diz que não existem estudos científicos que comprovem que pessoas com o HIV têm mais chance de serem hipertensas, ou que a doença pode ser causada pelos medicamentos do coquetel antirretroviral. Segundo ela, o que existem são dados que mostram que os soropositivos têm tendência maior a ter um evento cardiovascular (como infartos) com mais frequência.

“O que acontece é que a população com HIV está envelhecendo e muitos contraem o vírus já em idade mais avançada. No começo da epidemia, a aids era fatal. Só agora vemos essa população envelhecer com o vírus e começam a aparecer estes problemas, parece um processo natural”, acredita.

No entanto, uma pesquisa de 2003 realizada na Itália, que buscava investigar a hipertensão em soropositivos em tratamento antirretroviral, observou que a prevalência da pressão alta nesta população era quase três vezes maior do que em quem não tinha o HIV, chamado de grupo controle (34,2% contra 11,9%). Para a pesquisa, foram incluídos 287 pacientes HIV+ em uso de terapia, com idade média de 41 anos, e 287 indivíduos controle, pareados quanto a sexo e idade.

Um outro estudo, realizado pela Sociedade Brasileira de Cardiologia em 2010 com 958 pacientes soropositivos de Pernambuco, mostrou que 33,9% deles eram pré-hipertensos e 25,6% hipertensos, sendo que destes, 54,4% foram diagnosticados com pressão alta somente após o diagnóstico do HIV. Para os autores deste estudo, os elevados riscos cardiovasculares nos infectados pelo HIV mostram a necessidade de medidas preventivas e terapêuticas contra a hipertensão nesse grupo.

A vida com HIV e hipertensão
O campineiro Lino credita ao envelhecimento precoce causado pelo vírus da aids o surgimento de da hipertensão: “Eu já tinha uma tendência genética, mas acredito num conjunto de fatores (para o aumento da pressão), entre eles, o HIV”, diz.

Ele realiza exames de rotina a cada quatro meses e reclama da demora para marcar uma consulta com um cardiologista, pois este profissional não está nos centros especializados para tratamento das DSTs/Aids. “Na rede pública é muito difícil de conseguir, tanto que meus dois primeiros cateterismos eu fiz em São Paulo... É uma especialidade que demora muito mais para ter consulta do que os exames de rotina”, conta.
A reivindicação de profissionais de outras especialidades, que tratam de doenças que também incidem em pessoas com HIV, como a hipertensão, é uma crítica comum de pacientes com HIV/aids.

Dra. Roberta, do CRT, concorda com as reclamações. Para ela, a inserção desses profissionais nos centros especializados é realmente necessária, por ser uma demanda importante e porque os outros médicos têm conhecimentos limitados sobre áreas mais específicas.

“O tratamento para hipertensão entre quem tem e quem não tem HIV é praticamente o mesmo, a diferença é que alguns medicamentos não podem interagir com os antirretrovirais. Um cardiologista que está afastado desses centros tem o risco maior de não saber disso e de recomendar o remédio errado”, justifica.

Dra. Roberta explica também que a mudança no estilo de vida é sempre recomendada aos pacientes, já que fatores como obesidade, sedentarismo e tabagismo estão relacionados à hipertensão. “Mas sabemos que é muito difícil fazer um paciente mudar seus hábitos de vida e a maioria das unidades não disponibiliza programas para ajudar nisso, como o anti-tabagismo. Desse jeito é difícil inserir os pacientes”.

Lino não vê grandes impedimentos em sua rotina ao conviver com o HIV e com a pressão alta, mas ressalta os vários cuidados que precisa ter. “Além de tomar vários remédios, preciso ficar atento com a alimentação e não ingerir tanta gordura. A maior diferença é que não posso fazer tanto esforço e canso com facilidade, além de que com quase 60 anos fica difícil, por exemplo, conseguir emprego, porque para eles (Previdência Social), mesmo com HIV e outras complicações, eu estou apto a trabalhar, mas para empresa nenhuma eu estou”.

O Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde também relaciona as ocorrências cardiovasculares à mudança no perfil da epidemia. “A criação da terapia antirretroviral fez aumentar a preocupação com as complicações em médio prazo, como as alterações cardiovasculares. Hoje, as causas cardiovasculares estão entre as de maior impacto na morbimortalidade no paciente soropositivo”, informa o Departamento em nota.

O Departamento recomenda que o princípio da terapia para essas pessoas seja o estímulo a uma vida saudável.

Dia Mundial da Saúde
Neste 7 de abril, comemora-se o Dia Mundial da Saúde, cujo tema em 2013 é pressão alta. A Organização Mundial da Saúde (OMS) pretende encorajar a população mundial a medir sua pressão arterial e a adquirir certos hábitos (como exercícios físicos regulares e alimentação balanceada) a fim de reduzir o seu risco para a pressão alta.

Segundo a organização, 40% da população adulta tinha pressão alta em 2008 e 17,3 milhões de pessoas morreram de doenças cardiovasculares no mesmo ano.



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