Envelhecimento e Morte: estes nossos incômodos (des)conhecidos

Minha motivação inicial para escrever este artigo se deve ao fato de haver, sobretudo em nossa cultura atual, um grande silenciamento ou, no mínimo, certo mal-estar quando o assunto é envelhecimento e morte, algo que noto muito em minhas aulas de Desenvolvimento Humano quando trato do envelhecimento e morte com meus jovens alunos.


O fato é que desde que temos consciência da nossa existência como humanos temos medo de envelhecer e de morrer. E este é o grande paradoxo da vida, pois, só um humano tem consciência de sua existência e, portanto, de sua morte. É por isso que em muitos mitos encontramos deuses lutando contra a morte. É por isso também que nas concepções religiosas a vida após a morte ou a ressurreição é apresentada como possibilidade de vida eterna. Entretanto, só deuses podem vencera morte. Humanos não. Porque nós humanos somos mortais, não somos eternos, sendo esta uma realidade inexorável e inevitável – a de que todos nós iremos morrer um dia. Na Psicologia dizemos que a morte é irreversível.
Mas é fato também que ninguém gosta de pensar na morte, sobretudo na própria. Na verdade, em nossa cultura atual regida pela lógica do consumo em que “se eu tenho algo, eu posso tudo”, envelhecimento e morte são assuntos considerados fora de moda porque abalam a ilusão de sermos eternos, de podermos tudo.
Então, verdadeiras corridas contra o tempo são travadas: plástica, botox, exercícios desmedidos e exagerados, tudo para evitar o correr do tempo e manter a ilusão da eterna juventude. Mas, não pensem que esta evitação é bem sucedida e exitosa, pois, uma das regras do mundo mental é a de que quanto mais evitamos uma percepção, mais ela nos ameaça. Não será por isso que atualmente temos tantos filmes que apresentam o fim da espécie humana de maneira catastrófica e terrível? Outra consequência nefasta desta evitação fóbica do envelhecimento / morte é a perda do sentido da vida, já que não podemos ser aquilo que não somos mais.
Em grande parte, esta desvalorização do envelhecimento é fortemente estimulada em nossa cultura pela visão de desenvolvimento em arco, conforme chamamos na Psicologia. Trata-se de uma concepção que enxerga o auge da vida ocorrendo na fase adulta. Depois disso, é queda e morte. Ou seja, é o fim da linha.
Problematizando esta visão, a atriz americana Jane Fonda em uma palestra muito estimulante, propõe que o terceiro ato da vida não precisa necessariamente ser vivido como uma derrota. Tudo irá depender de como “encaramos a música”.
Explico-me. É realmente um fato que o corpo sofre profundamente deteriorações com a passagem do tempo. Dores, limitações, dificuldades de locomoção, etc. Mas, segundo ela, pensando do ponto de vista do desenvolvimento da mente, a melhor metáfora para expressar o envelhecimento não é a de um arco, mas a de uma escada.
Por que uma escada? Porque a mente humana, que ela chama de espírito, não precisa se atrofiar com as limitações do tempo. Como diria Bion, um importante psicanalista contemporâneo de Freud, a expansão da mente tende ao infinito.
Mas, o que determinará o modo como iremos “encarar a música” da vida, do envelhecimento e da morte? Não será o que vivemos, ou seja, as frustrações que a vida nos reserva, estas sim inevitáveis, mas, o modo como encaramos as nossas vivências. Dito de outro modo: o que seremos ou não capazes de aprender com a vida.
Eu discordo sempre de uma visão muito arraigada em nossa cultura de que envelhecer é sinônimo de maturidade. Porque envelhecimento não tem a ver com a idade cronológica. Tem a ver com a expansão da mente, com o aprender com as experiências, com expandir-se, expandir o seu olhar sobre a vida, sobre si mesmo e sobre os outros.
E isso tem muito mais a ver com sabedoria do que com o fato de fazermos aniversário.
Não é possível sabermos como iremos lidar com estes fatos tão incômodos daqui a uns anos - o de que todos nós envelhecemos e morremos. O fato é que hoje lidamos mal. E a saída para construirmos uma sociedade que lida melhor com este processo inevitável da vida passa pela educação. Não aquela formal, da escola. Mas, sim pela possibilidade de podermos conversar, pensar, dialogar a respeito. Escrever um texto como este. Ler, discutir e não silenciar.
E para terminar, deixo aqui uma citação belíssima de Rubem Alves sobre a morte:
“Diante da morte tudo se torna repentinamente puro. Não há lugar para mentiras. E a gente então se defronta com a Verdade, aquilo que realmente importa. Para ter acesso à nossa Verdade, para ouvir de novo a voz do Desejo mais profundo, é preciso tornar-se discípulo da Morte. Pois só ela nos dá lições de Vida se a acolhemos como amiga. A morte é nossa eterna companheira.” (Alves, 1991, p. 14).

Comentários