Médica defende suplementação com vitamina D a idosos


O alerta é da médica Marise Lazaretti Castro, professora de Endocrinologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), e pesquisadora do tema há mais de 15 anos


Alimentação inadequada não é a vilã da desnutrição dos idosos, e sim a falta de exposição solar
Agência FAPESP– A carência de vitamina D em grandes centros urbanos como São Paulo já atingiu índices alarmantes, especialmente entre os idosos. O alerta é da médica Marise Lazaretti Castro, professora de Endocrinologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), chefe do Setor de Doenças Osteometabólicas da Escola Paulista de Medicina e pesquisadora do tema há mais de 15 anos.
Nesse caso, no entanto, a alimentação inadequada não é a vilã, e sim a falta de exposição solar. A maior parte do nutriente é sintetizada na pele, com o estímulo dos raios ultravioleta. O processo é prejudicado pelo uso de filtros.
“Costumam dizer que 20 minutos de exposição nas primeiras horas da manhã ou no fim da tarde são suficientes, mas isso não é necessariamente verdade. É difícil você saber ao certo o quanto de sol é necessário. Pessoas negras precisam de mais tempo do que pessoas brancas e os idosos levam pelo menos o triplo do tempo para produzir a mesma quantidade de vitamina que os jovens”, afirma Castro.
O estilo de vida moderno, explica a pesquisadora, não favorece os banhos de sol. A fim de se adequar à nova realidade, é preciso suplementar.
Para Castro, a suplementação com vitamina D deveria fazer parte da rotina de acompanhamento geriátrico e ser regra entre os grupos de risco para fratura, como idosos institucionalizados, pacientes com lúpus, portadores de osteoporose e mulheres na pós-menopausa. Leia a seguir a entrevista concedida pela pesquisadora:
Mesmo sendo o Brasil um país tão ensolarado, é possível que a população sofra com a falta de vitamina D?
Marise Lazaretti Castro – A deficiência na população é muito grande, principalmente entre os idosos institucionalizados. Em uma pesquisa feita na cidade de São Paulo, mostramos que 92% dos 177 idosos institucionalizados avaliados tinham valores insuficientes de vitamina D. No caso dos 243 idosos que moravam em domicílio, o número foi de 85%. Entre os 141 jovens que compuseram o grupo controle, a taxa foi de 40%. Quando avaliamos a proporção de pessoas com deficiência de vitamina D, que são valores ainda mais abaixo do ideal, o índice foi de 40% entre os idosos institucionalizados, 15% entre idosos em domicílio e 5% entre os jovens. Essa pesquisa foi concluída em 2004 e estudos posteriores indicaram que, embora os números de deficiência entre idosos institucionalizados sejam assustadores, eles continuam não recebendo suplementação. Provavelmente os médicos nem se lembram disso. Agora existem dados nacionais robustos que confirmam nossos achados sobre a prevalência da deficiência de vitamina D em outras populações. A insuficiência é encontrada desde o Recife até Porto Alegre.
O que caracteriza a insuficiência e a deficiência de vitamina D e qual é a consequência em cada caso?
Castro – Os estudiosos mais conservadores afirmam que o ideal seria 20 nanogramas (ng) de 25-hidroxivitamina D (25OHD) – que é o metabólico dosado no exame – por mililitro (ml) de sangue. Nossos resultados, entretanto, estão de acordo com a Sociedade Americana de Endocrinologia, que defende valores acima de 30 ng/ml. Abaixo de 10 ng/ml é considerado deficiência. Valores entre 10 e 30 ng/ml são considerados insuficiência e já estão associados ao aumento do risco de fratura osteoporótica, pois há elevação da produção do hormônio da paratireoide, o PTH, que provoca a desmineralização do osso. Esse quadro é conhecido como hiperparatireoidismo secundário à insuficiência de vitamina D. Já os casos de deficiência causam uma doença ainda mais grave: a osteomalácia, que é o amolecimento dos ossos. Também causa fraqueza muscular muito grande. Estudos recentes têm associado a deficiência de vitamina D a uma série de outros problemas de saúde, como câncer de mama, de próstata, colorretal, além de condições autoimunes, como diabetes e esclerose múltipla.
Quais são as causas da hipovitaminose na população brasileira?
Castro – Falta de exposição solar e uso de filtro solar. Quando os médicos recomendam aos seus pacientes que usem protetor e evitem o sol do meio-dia, deveriam também prescrever suplementação de vitamina D. Dizem que 20 minutos de exposição nas primeiras horas da manhã ou no fim da tarde são suficientes, mas isso não é necessariamente verdade. É difícil você saber ao certo o quanto de sol é necessário. Pessoas negras precisam de mais tempo do que pessoas brancas e os idosos levam pelo menos o triplo do tempo para produzir a mesma quantidade de vitamina que os jovens. Além disso, é necessária uma dose eritematosa de raios ultravioleta para estimular a produção de vitamina D, ou seja, aquela quantidade de sol que deixa a pele avermelhada. Os dados de nossas pesquisas mostram que os níveis séricos de vitamina D estão muito vinculados à exposição solar e há uma variação sazonal. Os meses após o verão, ou seja, no outono, foram aqueles em que os níveis estavam mais altos. Após o inverno, foram os meses com níveis mais baixos. Nos jovens, a queda é de quase 50%.
A alimentação influencia?
Castro – É praticamente irrelevante. Trabalhos recentes mostram que a ingestão diária fica abaixo de 100 unidades de vitamina D por dia. São poucos os alimentos com quantidades significativas e eles não são consumidos com muita frequência – peixes gordos como atum, salmão e cavala. Agora começaram a surgir alimentos fortificados com vitamina D, como iogurte e leite. Pode ser que melhore um pouco a ingestão, mas não acho que vai suprir a quantidade ideal.
Qual seria a ingestão diária ideal?
Castro – Costumamos nos basear nas determinações das agências de saúde americanas. Na última revisão eles aumentaram para 600 unidades diárias, mas ainda acho pouco, principalmente para os grupos de risco para fratura. Um trabalho feito com pacientes atendidos no Ambulatório de Osteoporose da Disciplina de Endocrinologia da Unifesp – a maioria composta por mulheres na pós-menopausa – mostrou que, pelo menos nesse caso, foi necessária uma ingestão acima de 2 mil unidades diárias para manter os níveis ideais. Esse trabalho também mostrou que os pacientes que praticavam atividade física tinham níveis maiores de vitamina D.

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